A linha de crédito do Governo português para negócios com Angola ainda só apoiou 17 empresas e o valor das verbas concedidas desde Maio é de 20 milhões de euros, ou seja, 4% do total disponível.
Por Luís Villalobos (*)
O Governo rejeita a ideia de que a linha de financiamento é demasiado burocrática, mas diz que não é “de subscrição fácil”.
O impacto da crise económica em Angola junto das empresas portuguesas foi suficientemente forte para o Ministério da Economia anunciar, no final de Abril, a criação de uma linha de financiamento específica para ajudar a tesouraria das Pequenas e Médias Empresas (PME) ligadas ao mercado angolano.
No entanto, até agora, e segundo dados do Ministério da Economia solicitados pelo Público, apenas 17 empresas estão a beneficiar desse apoio, num total de 20 milhões de euros. A baixa expressividade deste número de PME fica patente quando se sabe que no início de Junho havia já 312 pedidos de crédito, correspondentes a 121 milhões de euros. E, olhando para o valor já utilizado, este corresponde a apenas 4% do total de 500 milhões de euros que foi disponibilizado para a linha de financiamento.
Questionado sobre se há uma excessiva burocratização no acesso ao crédito disponibilizado, o Ministério da Economia nega essa ideia, embora diga que não é de acesso simples. “Não percepcionamos a linha como burocrática, mas tal não quer dizer que seja uma linha de subscrição fácil. Aliás, quando o crédito é concedido em euros em Portugal e a garantia é dada em Angola em kwanzas, não estamos obviamente a falar de uma linha simples”, afirmou fonte oficial do Ministério da Economia.
De acordo com a mesma fonte, “uma das explicações para a expressão da procura é que, de facto, muitas empresas preferem recorrer à linha PME Crescimento 2015 na vertente fundo maneio, dando como garantias activos patrimoniais em Portugal”.
O Público tentou uma reacção por parte da Câmara de Comércio e Indústria Portugal-Angola, presidida por Paulo Varela, mas tal não foi possível. Em Julho, este responsável afirmou em Luanda, de acordo com a Lusa, que a linha era “extremamente complexa” e que estava a ser “difícil de operacionalizar”, ao envolver 18 entidades bancárias e as autoridades dos dois países. “Será necessário contornar algumas implicações legais, nomeadamente decorrentes de prazos de determinados documentos”, referiu Paulo Varela.
A baixa do preço do petróleo, desde Junho do ano passado, tem afectado as contas de Angola, provocando um recuo nas encomendadas e no consumo, mais atrasos nos pagamentos às empresas e dificuldades na expatriação de capitais (devido à falta de divisas internacionais). Esta situação deverá manter-se a médio prazo, acentuando a pressão sobre as PME portuguesas que têm negócios com este mercado.
Na sexta-feira à noite, a agência de notação Fitch desceu o rating de Angola, para B+, devido à exposição do país ao petróleo, o que provocou uma subida da dívida pública, a descida das reservas monetárias e um crescimento mais fraco do que o estimado.
De acordo com os últimos dados do INE, em Julho voltou-se a assistir a uma queda expressiva das vendas de produtos portugueses para este país, de -33,8%, ou 93,5 milhões de euros, em termos homólogos. Desde o início do ano, a queda é de 26,8%, equivalente a 460 milhões de euros.
Em termos de empresas ligadas ao mercado angolano, os números são bem expressivos: em 2014 existiam 9440 empresas em Portugal a exportar para Angola. Deste universo, 5256 empresas (mais de metade do total) dependiam a 100% de Angola para realizar as suas vendas para fora do mercado português. Em valor, representaram 1234 milhões de euros, o que representou do 41% do montante arrecadado com as exportações para Angola durante o ano passado.
Existem ainda outras 660 empresas que dependem a 91% e 99% de Angola para vender ao exterior, a que se somam outras 522 com uma exposição de 76% a 90%.
(*) In: Público